O cupuaçuzeiro é uma fruteira que se originou em terras paraenses e maranhenses. Apesar das populações nativas terem sido muito afetadas no processo de derruba e queima da floresta para o estabelecimento de pastagens e outras atividades agropecuárias, ainda restaram alguns resquícios no Sudeste paraense. Nessa condição a planta é totalmente diferente das que encontramos nas áreas cultivadas. Atinge mais de 30 m de altura, só perdendo para as espécies clímax como por exemplo a castanheira e o mogno.
Os indígenas dessa região tinham no cupuaçu umas de suas frutas prediletas, tanto que, no processo nômade de viver, levavam as sementes dos cultivos que mais lhe apeteciam, para plantar no novo destino. Dessa forma, disseminaram as sementes de cupuaçuzeiro por toda a Amazônia. Hoje pode-se encontrar árvores de cupuaçuzeiro em 112 municípios do Pará (total de 144), em condições subespontâneas, graças a essa movimentação.
Os silvícolas também tiveram papel fundamental no processo empírico de domesticação da espécie, visto que, escolhiam os frutos mais atraentes, de onde retiravam as sementes, para estabelecer os quintais nas novas moradias.
Nessa época a oferta de frutos para comercialização era bastante restrita. Basicamente, provinham dessas populações. Era no Ver-o–Peso e nas feiras livres, bem como, nos pomares caseiros de casas urbanas, que nossos pais e avós conseguiam o fruto.
A situação começou a mudar na década de 1970, quando o cupuaçuzeiro passou a ser plantado como uma cultura agrícola, especialmente pelos produtores de Tomé Açu. A oferta de frutos começou a melhorar rapidamente, e o preço tornou-se mais atraente.
Com a ampliação dos cultivos, apareceram gargalos tecnológicos que demandavam pesquisas imediatas. O grande complicador era que, por ser uma espécie perene, os resultados de pesquisa só aconteceriam à longo prazo.
Coube ao IAN, IPEAN e depois Embrapa Amazônia Oriental e seus parceiros, dar início a criação de tecnologias que tornaram esta cultura uma realidade. A adaptação das técnicas utilizadas no cacaueiro foi a estratégia empregada para viabilizar o estabelecimento do cultivo do cupuaçuzeiro. Nesse esforço de pesquisa, nomes como Benito Calzavara (1922-2011), Eurico Pinheiro (1927-2011), Carlos Hans Muller (1947-2016), José Edmar Urano de Carvalho e Rubens Lima (1918-2014), além de outros, tiveram papel primordial. Rubens Lima, por exemplo, foi o responsável pela formação da primeira coleção de cupuaçuzeiro, estabelecida em Belém. Essa coleção foi a fonte das primeiras cultivares resistentes a vassoura de bruxa, que foram disponibilizadas aos produtores em 2002, pela Embrapa Amazônia Oriental, denominadas BRS Coari, BRS Codajás, BRS Manacapuru e BRS Belém. Depois veio a BRS Carimbó, em 2012 e, por último, em 2023 as cultivares BRS Careca, BRS Fartura, BRS Duquesa, BRS Curinga e BRS Golias, componentes do Kit Cupuaçu 5.0.
Assim, o cultivo do cupuaçuzeiro expandiu-se chegando a 12.000 ha no estado do Pará. Essas estatísticas são muito inconsistentes em razão do tamanho continental do Estado e da pulverização dos plantios. Essa desorganização da produção é uma das principais fragilidades da cadeia. Como o fruto é perecível, necessita de uma agroindústria próxima para processa-lo. Não havendo, o produtor fica à mercê do atravessador, que quase sempre não paga o preço justo.
A renda advinda da comercialização dos frutos tem servido para complementar a receita da propriedade, especialmente, dos pequenos produtores, que respondem por 95% da produção.
A visão econômica não é a única faceta benéfica da utilização do cupuaçuzeiro. Junto com o cacaueiro, é uma das poucas espécies, com valor econômico, que tolera restrição de luz, em até 30%. Assim, molda-se com perfeição aos Sistemas Agroflorestais (SAFs), modelo de cultivo imitador das condições florestais originais, que deverá ganhar cada vez mais importância com o agravamento das mudanças climáticas. Portanto, essa espécie poderá contribuir na recuperação produtiva de áreas alteradas, reflorestando-as, ao mesmo tempo que propicia condições dignas de manutenção aos produtores envolvidos.
Graças as técnicas de cultivo desenvolvidas, e a disponibilidade de variedades de alta produtibilidade, propagadas por sementes e por mudas enxertadas, o cupuaçuzeiro, juntamente com o açaizeiro, é uma das poucas espécies nativas da Amazônia apta para ser cultivada em larga escala, assim que o mercado se mostrar favorável para absorver seus produtos.
Rafael Moysés Alves
Pesquisador da Embrapa Amazônia Oriental
Fotos: Ronaldo Rosa
Deixe um comentário